domingo, 24 de março de 2013

Um Omelete no Travesseiro


Um omelete no travesseiro
O acordo entre as lideranças partidárias que deu de bandeja ao Partido Social Cristão a presidência da Comissão de Direitos Humanos e Minorias da Câmara possibilitou ao país assistir a um movimento inédito: um presidente de claras inclinações racistas e homofóbicas ser eleito representante das minorias sobre as quais nutre um desprezo declarado.
O pastor Marco Feliciano foi autor de diversas declarações públicas, puramente racistas e homofóbicas, que reproduzem o ódio e a intolerância aos LGBTs e aos negros. “A AIDS é o câncer gay”; “a maldição que Noé lança sobre seu neto, Canaã, respinga sobre o continente africano, daí a fome, pestes, doenças, guerras étnicas (...) (...) a África é um continente amaldiçoado”; são algumas das pérolas de seu pensamento. Tão logo seu nome foi aventado, multiplicaram-se reações contrárias à sua indicação. Não obstante, foi eleito com 11 votos a favor e apenas um branco. Terá agora, oficialmente, a chance de combater por dentro o que chama de privilégio de uma minoria rude e barulhenta. Uma minoria cujas bandeiras ele reluta em reconhecer como legítimas.
Ainda que se tenha de respeitar e conviver com o pensamento divergente, não há como não reconhecer que a sua eleição representa um paradoxo, uma inadequação, para não dizer um absurdo retrocesso. Os dias de hoje produzem uma sensação de urgência e favorecem tendências fundamentalistas, mas isso também, inegavelmente, prejudica dramaticamente o discernimento e a tolerância para debater visões diferentes e a pessoa do pastor Feliciano, por tudo o que ele disse e por tudo o que dele se disse, certamente não conduzirá a Comissão de Direitos Humanos e Minorias a um bom debate. O que se esperar de quem discrimina minorias discriminadas que bem ou mal agora formalmente as representa; ou o que se esperar de quem a partir de agora será o responsável por receber e encaminhar investigações de abusos que hoje evita reconhecer a gravidade.
Para além da indignação com a eleição, é preciso entender que isso não ocorreu por acaso. A distribuição do comando das comissões segue o tamanho da bancada de cada legenda; cada líder partidário escolhe quais comissões a sigla deve presidir. A Comissão de Direitos Humanos foi a penúltima a ser escolhida pelos líderes partidários; ou seja, outras 19 comissões eram consideradas mais importantes. Dias antes fomos brindados com a escolha de Calheiros para a presidência do Senado, ele mesmo que renunciou em 2007 diante de denúncias de corrupção; agora, a Comissão de Direitos Humanos e Minorias é entregue a um inacreditável pastor Feliciano, um sujeito incapaz de compreender sua própria inadequação. Algo como um omelete no travesseiro (BAUMANN – algo completamente fora do lugar). Isso demonstra a absoluta falta de sintonia do parlamento com a lucidez e indica mais uma vez, que as mudanças e os avanços esperados, de lá é que não virão.
Mauro Borba
Diretor de Direitos Humanos da AJURIS

FONTE: Artigo do diretor de Direitos Humanos da AJURIS,
Mauro Borba, publicado na edição de hoje (22/3) do jornal O Sul.

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